"ENSAIO DE AUTO AJUDA
DEMOCRÁTICA”
"Odeio
perder. Tanto que às vezes penso que o sentido da vida é justamente aprender a
perder. Perdemos o aconchego do útero materno, cortam-nos o cordão umbilical,
inclusive, para não restar dúvida da perda primordial da vida. A medida que
crescemos perdemos roupas e sapatos, perdemos nas brincadeiras e nas brigas.
Perdemos por distração, por incompatibilidade, por incapacidade de vencer. Por
inúmeros outros motivos. Perdemos amigos e amores nesse mundo grande de meu
deus. Perdemos a nós mesmos, em determinados momentos. Perdemos na escola, no
vestibular, em entrevistas de emprego, em concurso. Perdemos foco, disciplina,
concentração. Perdemos hora, perdemos lugar. Perdemos chão, perdemos família.
Perdemos tudo a toda hora e são muitos os sentidos da perda. E seguimos em
frente, resignados ou sôfregos. Lamentamos e aprendemos que o lamento deve ser
breve, que o que urge é a preparação para nova perda. Mas perder também é
potência, posto que fornece vestígios de padrões de perda, que podem ser
elaborados em estratégias – tanto para conquistar a almejada vitória quanto
para conformar o duro hábito de perder. Perdemos a potência da perda,
tornando-nos ainda mais perdedores, quando transferimos a responsabilidade e
nos limitamos a apontar os culpados da perda. Em troca da sua potência, a perda
exige única atividade do perdedor: reflexão. Tão importante quanto as retóricas
quem-sou-eu ou qual-o-sentido-da-vida, impera o onde-foi-que-eu-errei.
Portanto, caros amigos, superem a dor de perder e tentem encontrar os vestígios
da perda. Compreendo que não estamos acostumados a perder para mulher, para
preto e para nordestino. Perder para bicha, traveco e sapatão. Perder para
menores infratores, para a inclusão social, para perda de privilégios, para
política social. Perder para o povão – quem diria! Sugiro que superem o
lamento, a transferência de responsabilidade, a culpabilização, provocados por
inacabada e gigantesca lista. Acatar a vitória da maioria não consiste apenas
no pressuposto da democracia, trata-se do fundamento basilar da reflexão e
consequente potência da perda. Aprendam a perder. Assim, quem sabe da próxima
vez?"
Laura Paes Machado
Assistente Social
CRESS 5657 5ª Região
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